Hoje vou falar sobre o Castelo Mourisco da FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz – que foi uma surpresa para mim descobrir que ele era uma reminiscência Ibérica. Por residir próximo a ele sempre o achei majestoso, porém não conhecia sua história e nunca o havia visitado. Quando fui pesquisar algumas construções para a realização do trabalho me deparei com a informação de que ele era inspirado na época do domínio muçulmano na Península Ibérica, e então resolvi conhecer um pouco melhor a sua história.
Vamos a ele…
O Castelo Mourisco é um edifício que faz parte do Complexo do Instituto Oswaldo Cruz em Manguinhos, na cidade do Rio de Janeiro. Ele é a sede desse Complexo que é uma fundação de pesquisa científica. Foi construída em estilo Neomourisco devido ao desejo de seu fundador, Oswaldo Cruz, que se encantou com esse estilo durante uma de suas viagens a Europa.
Sua inspiração foi o Mourisco, também chamado de Mudejár, característico dos hispano-muçulmanos após a reconquista. A arte islâmica que foi levada à Espanha pelos muçulmanos era rica em tradições e ornamentações geométricas, essa manifestação artística foi considerada a maior da sociedade medieval espanhola e se expandiu durante a baixa Idade Média. Um exemplo está no Palácio de La Alhambra, localizado na cidade de Granada, fundada em 756 pelos mouros na região de Andaluzia, na Espanha. Foi a inspiração central e razão do surgimento do termo Alhambrismo para designar a retomada do estilo, agora como neomourisco, no século XVIII.
No Brasil esse estilo chega a meados do século XIX. O Castelo Mourisco é a única edificação civil ainda existente no Rio de Janeiro e por ser considerado um dos raros exemplos neomouriscos remanescentes foi tombado em 1981 pelo Instituto do patrimônio Artístico e Histórico Nacional (IPHAN).
Esse edifício, também chamado Pavilhão Mourisco, foi construído no início do século XX, pelo engenheiro-arquiteto português Luiz de Moraes Júnior, a partir de um croqui desenhado por Oswaldo Cruz após uma de suas viagens para a Europa. O arquiteto foi responsável por traduzir o desejo de Oswaldo que era recriar a linguagem mourisca da península Ibérica e prestar uma homenagem à importância da medicina árabe.
Inicialmente o Pavilhão abrigava bibliotecas, museu e laboratórios. Posteriormente, com a expansão do Complexo, ele passou a abrigar a presidência e seus órgãos, a direção do Instituto, o Salão de Obras Raras da Biblioteca de Manguinhos, a Coleção Entomológica, a Sala Oswaldo Cruz e outros espaços museológicos.
O Castelo possui sete pavimentos e seu elevador é o mais antigo em funcionamento na cidade do Rio. Suas varandas possuem azulejos e mosaicos, importados da França e de Portugal, que lembram tapetes e passadeiras árabes. Suas luminárias são de bronze, e nas paredes encontram-se arabescos tipicamente islâmicos. Por todo o edifício é possível observar padrões geométricos na decoração, aspecto tipicamente islâmico.
A Biblioteca do Castelo que guarda o Salão de Obras Raras fica no terceiro pavimento e lá estão obras que se estendem dos séculos XVII até o XX. Entre documentos de todas as áreas do saber se destacam os voltados às ciências biológicas, medicina e ciências naturais. Alguns exemplos são o primeiro Tratado de História Natural do Brasil de 1648 e a tese de Oswaldo Cruz. A Biblioteca é aberta a comunidade acadêmica bastando preencher um formulário para consulta, devido à fragilidade das obras empréstimos não são permitidos.
Renato da Costa Gama mostra em seu trabalho um artigo retirado da Revista Cosmopolita, publicada em 1913, que mostra como o Instituto era visto na época: uma gigantesca obra-prima da arte e da ciência e que estava bem guardada do alcance dos meros mortais. Essa visão tinha relação com o fato do edifício principal, o Castelo Mourisco, não permitir na época o acesso da população em geral, mas esse isolamento era devido ao receio do manejo de material biomédico provocar algum tipo de contágio na população. Essa visão, com a evolução da medicina, foi aos poucos superada, e então o prédio foi tornado acessível a todos.
O Instituto, imponente e requintado, sofreu com as degradações do tempo e por isso foram feitos trabalhos de conservação e restauração do conjunto arquitetônico, especialmente do Castelo Mourisco. Este devido à localização no alto de uma colina está exposto a ação dos ventos e chuvas ácidas, além de variações constantes de temperatura o que favorece o desgaste mais rápido de sua construção. Com esse processo de restauração que foi feito pelo Departamento do Patrimônio Histórico, o Castelo passou a ostentar, desde 1994, uma nova iluminação, concebida por Ney Matogrosso.
Embora saibamos de algumas das intenções de Oswaldo Cruz quando resolveu basear a arquitetura do Pavilhão no estilo Mourisco, é difícil dizer se foram apenas o deslumbre por um estilo e a vontade de homenagem que o induziu a isso. Porém, o fato é que essa construção representa não apenas um grande incentivo e evolução da pesquisa científica brasileira, mas também uma forma de compreensão e divulgação da influência histórica hispano-muçulmana no Brasil, uma das últimas que ainda resistem, e que também serve de resgate de parte da história.
Obs.: Para informações sobre visitas acesse o site da instituição em: http://www.coc.fiocruz.br/. Mais fotos do Castelo e seu interior podem ser vistas em: http://www.coc.fiocruz.br/index.php/pavilhao-mourisco#.V59gP_krLIU
BIBLIOGRAFIA
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FRANQUEIRA, Márcia Lopes Moraes, “A restauração do ‘pavilhão Mourisco’”, In: COSTA, Renato da Gama-Rosa, Caminhos da Arquitetura em Manguinhos, FIOCRUZ, Casa Oswaldo Cruz, FAPERJ, Rio de Janeiro. 2003. 121-127p.
HARRIS, Ana Lúcia N.C. & MONASTÉRIO, Clélia Maria C.T. “O Pavilhão Mourisco da Fiocruz no Rio de Janeiro – Aspectos históricos, levantamento fotográfico e catálogo da arte geométrica aplicada na arquitetura”. Revista Eletrônica 19&20, Rio de Janeiro, Vol. V, nº 3. jul. 2010. Disponível em: < http://www.dezenovevinte.net/arte%20decorativa/fiocruz_mourisco.html >. Acesso em: Nov. 2015.
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